Faltam 15 dias
Há uns dias, depois de um dos debates das Legislativas 2025, o meu filho suspirou e disse: «já nem sei em quem votar». Pela primeira vez, pensei o mesmo.

Disclaimer: Cá em casa, votamos à esquerda.
As intervenções dos candidatos foram tão pensadas, preparadas, polidas, que dei por mim a analisar a forma («sim senhora, excelente analogia») e a não prestar atenção ao conteúdo.
Isso é grave. Mas se calhar fica bem no CV de alguém.
Esqueçam, por um dia, que estão a fazer carreira na política; finjam que o que vos move é o serviço público.
Nas Legislativas Regionais de 2024, estava, por coincidência, nos Açores durante a campanha eleitoral. Estava a escrever o Pocket Azores (alerta shameless plug) e, por isso, passava algum tempo em cafés e restaurantes, metia conversa com muita gente. Depois, quando via o resumo da campanha e dos discursos do dia no telejornal, confirmava as minhas suspeitas: os políticos não ouvem.
A campanha começa oficialmente hoje, 4 de Maio. Ainda vão a tempo:
Quando é que nos encontramos para eu, cidadã votante não-militante, colocar-vos as minhas questões e dúvidas acerca do vosso programa político? Atravesso-me à bruta durante uma arruada? Salto para cima de uma banca numa feira ou num mercado? Sento-me à porta da vossa sede? Infiltro-me na banda do vosso concerto-comício?
Por curiosidade, dei-me ao trabalho de ver as agendas de todos os partidos com assento parlamentar só para esta primeira semana (excluindo o debate):
AD (PSD/CDS) — Três arruadas (inclui duas feiras); um almoço-comício; dois comícios. Nada de novo.
BE — Se existe, não a encontrei.* Se eu quiser acompanhar a campanha, tenho de subscrever uma newsletter? Dar-vos assim o meu e-mail sem um first date?
CHEGA — Se existe, não a encontrei. Mas este é aquele partido que faz tudo à porta fechada né?
CDU (PCP/PEV) — Duas arruadas; dois almoços-comício; um jantar-comício. Também, nada de novo e, para ser honesta, bastante on-brand.
IL — Se existe, não a encontrei. Recuso-me a ter de vos seguir nas redes sociais ou juntar-me a um grupo de WhatsApp para estar informada. Num site posso impedir, de forma fácil, que sigam as minhas pisadas digitais; numa rede social, não. E eu sei que vocês sabem.
LIVRE — Se existe, não a encontrei.* Encontrei as datas das Assembleias do partido e uns eventos chamados Café com Deputados de 2024. (Palmas para esta iniciativa de proximidade; o caminho é por aqui).
PAN — Têm uma agenda de eventos! Yay! De 2024…* Não, não quero saber dos eventos pelas redes sociais. Desculpa, Inês. Mas podemos marcar um cat play date.
PS — Têm uma agenda! Yay! A página diz No event found… E, pá, testem as vossas hashtags num software TTS (text-to-speech). Testei em dois sítios diferentes e #OFuturoéJá foi lido como: «Ó futuro éja» e «Ó futurajá».
*Às vezes, ainda trabalho como Web Content Writer (apesar de preferir escrever terror). Tenho ideias (e dicas). Nenhuma é de borla, mas posso considerar preços de amigue. 🙂
Quero:
Town halls com não-militantes e não-simpatizantes. Se trouxerem petiscos e vinho, podemos fazer cá em casa. Eu até estou disposta a incluir representantes da AD, da IL e do CHEGA. Do meu lado, garanto diversidade de cidadãos, de todos os espectros políticos. E imponho estas regras: um candidato ou representante por partido (assessores, seguranças, assistentes, emotional support ass-kissers etc. ficam todos lá em baixo no estacionamento à espera); os telemóveis DE TODOS ficam numa caixa trancada, na minha posse (ninguém grava ou filma nada); nenhum candidato veta perguntas; de cada vez que um candidato interromper um cidadão, aperto uma daquelas buzinas que as claques usam nos jogos de futebol; se alguém se exaltar (seja candidato ou cidadão), é borrifado com água e fica trancado na varanda durante 5 minutos em time-out.
Debates e discursos para as pessoas e não para as audiências ou para os diretos às 20 h. Só vos uso como barulho de fundo quando estou a escrever; retiro zero informação útil. O líder marciano do Mars Attacks! (Tim Burton, 1996) consegue dizer mais do que qualquer um de vocês.
Que não continuem a dizer «os portugueses querem/não querem». Por favor, não falem por mim, nem agarrem numa estatística ou sondagem que vos favorece para passarem a imagem de que me estão a ouvir.
Discursos que não incluam «o anterior governo fez/não fez». Mimimimimimimimimi. Não. Quero. Saber. Digam-me o que é que vocês propõem fazer. Estão muito parecidos com este cartoon: