Dicas para escritores #3 — Oficinas de escrita
Há uns anos, eu era da equipa «para quê fazer uma oficina de escrita se eu já "sei" escrever?» Depois, mudei de ideias. Hoje, falo-te das 5 coisas que considero antes de escolher uma oficina.
Sinto que, por vezes, há pessoas que recorrem a oficinas de escrita criativa achando que vão aprender uma fórmula infalível para transformá-las em escritores de sucesso de forma automática.
Se te estão a prometer resultados instantâneos, mais vale gastares esse dinheiro em raspadinhas porque vai dar ao mesmo.
Nem sequer vou falar sobre o que é um «escritor de sucesso». Não hoje, pelo menos.

Coisas que as oficinas de escrita criativa não ensinam:
A gostar de escrever e a preferir a escrita para comunicar e/ou contar uma história (ou «ter jeito»);
A ter ideias originais;
A ter um estilo próprio, uma voz;
A ter «sucesso».
Coisas que as oficinas de escrita criativa ensinam:
Disciplina (escrever é um trabalho prazeroso, mas continua a ser um trabalho);
Ferramentas e técnicas;
A fazer auto-edição para olharmos para um texto nosso de forma crítica (não no sentido de «está tudo uma merda», mas no sentido de veres, objetivamente, o que é que funciona e não funciona.);
A partilhar e a receber feedback construtivo dos nossos pares.
Para mim, até agora, as oficinas e cursos relacionados com a escrita têm sido uma espécie de formação contínua, ou aqueles cursos de reciclagem que algumas profissões exigem de tempos a tempos.
Como escolher uma oficina
Há umas semanas, estava a ouvir o primeiro episódio da 3.ª temporada de Livros da Pi*a (recomendo o podcast completo, aquele episódio em particular e os interlúdios Livro do Car*lho) e, a propósito do livro em discussão (Monstro, de Rui Sinel de Cordes), falaram de umas oficinas de escrita de humor (umas masterclasses, vá) que o autor tinha organizado.
Bruno Henriques tinha participado nessas aulas e via valor em fazer oficinas de escrita criativa (não essas do Sinel de Cordes); Sérgio Duarte revelou que era contra oficinas de escrita criativa, porque achava que as pessoas só se inscreviam com a ilusão de que bastava isso para se tornarem escritoras da noite para o dia.
Percebo os dois lados, mas pendo mais para o lado do Bruno (não, não somos da mesma família).
Há cinco coisas (para além do preço, das datas e do horário) que peso para escolher uma oficina:
Conteúdos concretos
Costumo torcer o nariz quando olho para o programa e não vejo nada de muito concreto. Diz-me que estar ali, presencialmente ou online, ou não estar vai dar ao mesmo. Ou melhor, fazer aquela oficina seria o mesmo que ler livros e artigos, ouvir um podcast sobre o tema ou ver uns quantos vídeos no YouTube.
Estes cursos terão também tendência para serem muito vagos sobre o público-alvo (ver mais abaixo) e afirmam dirigir-se a «todos aqueles que querem saber mais sobre escrita». Portanto, tu, que queres desenvolver ferramentas e técnicas de escrita, podes ver-te numa turma onde a maioria das pessoas está ali para passar o tempo.
Não ser só teoria
Um curso ou oficina sem TPCs não ajuda muito. O objetivo dos exercícios é precisamente consolidar conhecimentos e tirar dúvidas na sessão seguinte.
Claro que, a olho nu, nem sempre é fácil de perceber se determinado curso é só teórico, mas estes dois pormenores podem dar pistas:
Masterclass em pele de workshop — uma «oficina» com menos de duas horas é, na verdade, uma masterclass. Sim, mesmo que tenha «curso» ou «workshop» no nome. Em tão pouco tempo, falando especificamente de um curso em tempo real, dificilmente haverá espaço para interacção entre professor e alunos.
«Aprende ao teu ritmo» — nada contra quem prefira este método de aprendizagem, e estes cursos assíncronos até podem incluir exercícios, mas quem é que te dá feedback? Se não recebes retorno e, se necessário, uma orientação para corrigir o rumo, não serve de muito.
Quem dá a formação
Podem optar por uma formação dada por um autor que vocês admirem e com quem, certamente, têm muito para aprender. A minha experiência tem-me mostrado que, sim, posso inspirar-me a lê-los, mas eles não são necessariamente bons a ensinar.
Já nem vou ao ponto de dizer que só devem fazer cursos com formadores certificados, porque isso é uma escolha pessoal e depende dos vossos objetivos. Mas procurem aprender com alguém que tem alguma experiência a dar cursos e oficinas síncronas, em sala ou online.
Público-alvo
Para mim, a maior red flag é a ausência total de informação sobre a quem determinada oficina se destina. Ou dizem só algo genérico como «para pessoas maiores de 18 anos e com acesso à Internet». Certo.
Cheira-me mais a money grab do que a transmissão e partilha genuína de conhecimento.
Claro que nada impede que haja um ou outro colega de turma que pareça ter caído ali de paraquedas, apesar de os destinatários estarem muito bem identificados.
«Faz o que eu digo, não faças o que eu faço.»
Por último, procuro um curso que desenvolva as minhas competências, que me mostre as ferramentas que posso usar e que seja trabalho e treino.
O conceito «chave na mão» sempre me fascinou, pela negativa. Na formação, encontra-lo naqueles cursos e oficinas em que o formador promete ensinar «o seu método» ou partilhar contigo «como faz as coisas». Se eu quisesse saber isto, assistia a uma palestra ou uma masterclass do autor.
Este método de ensino (se é que lhe posso chamar isso) está para as oficinas de escrita criativa como o estudar para passar no exame nacional está para o ensino secundário. Não deixa espaço para a criatividade, para a tentativa e erro, para caminhos alternativos.