Dica para escritores #1 - Submissão de contos
O que fazer (e não fazer) quando submetes um conto a uma «open call» ou a um concurso literário.
Nos últimos dois anos, devo ter lido perto de 300 contos (ou mais; às tantas, deixei de contar) como júri e há uma série de «erros» que se repetem e que podem ser evitados.

O papel do júri ou do responsável pela seleção dos contos
A nossa função é ler o texto, sem distrações gráficas (já lá vamos), com a objetividade possível — o que deve importar é a qualidade da escrita e não gostos pessoais — e tomar notas.
Dependendo dos concursos e da quantidade de textos submetidos, tento não ler mais do que três por dia. Quando isso não é possível, estabeleço um máximo de 10 por dia, divididos em dois blocos (nem sempre 5-5, porque depende do número de palavras de cada texto).
Tirando isso, estes são os passos que sigo sempre:
Todos os contos passam por uma primeira leitura integral e por uma pré-avaliação que registo, da forma o mais detalhada possível, numa folha de cálculo;
Nessa pré-avaliação, há dois resultados possíveis: rejeitado ou shortlisted;
Os shortlisted passam por uma segunda leitura e, depois, ou passam a semi-finalistas ou a rejeitados;
Dependendo do funcionamento do júri, os semi-finalistas passam por uma terceira e última leitura (minha) ou são discutidos nas reuniões regulares com os outros membros.
Avalio se a história está bem escrita e não o conteúdo.
O que fazer (e não fazer) antes de submeter um conto
Falei de distrações gráficas porque há pequenos «embelezamentos» que os autores decidem fazer e que não acrescentam absolutamente nada ao texto — são relativamente inofensivos, mas obrigam-me a um esforço adicional para me concentrar apenas na leitura.
Depois, há pecados capitais que impedem que aquele conto chegue à fase de leitura. Imagina perderes a corrida por causa de um «pormenor»?
TL;DR? Descarrega esta checklist antes de submeteres o teu próximo conto.
O que fazer:
Ler o regulamento do concurso, com especial atenção às regras de formatação, número máximo de palavras e como submeter. Em caso de dúvida, geralmente há um endereço de e-mail para contacto.
Enviar um texto o mais «limpo» possível de erros ortográficos. Como autora, sei que há falhas que nos passam ao lado, sobretudo depois de já termos lido o mesmo texto várias vezes. Por isso, consigo distinguir entre um erro passageiro de um frequente; e são os frequentes, que se repetem ao longo do texto, que me fazem perder a vontade de continuar a ler.
Garantir que submeteste o conto sem revelar a sua autoria, quando o regulamento pede textos anónimos. Isto é, não ponhas o teu nome em lado nenhum do documento (no nome do documento, no título, no rodapé, etc.. Em lado nenhum.) Vou ainda um pouco mais longe, apesar de, habitualmente, não ser motivo para desclassificação, não partilhes partes do teu texto nas redes sociais, informando os teus seguidores que acabaste de submetê-lo ao concurso X.
Dar um nome simples ao ficheiro. Há, inclusive, regulamentos que definem regras para isto. Tens um formato próprio para organizar os teus ficheiros digitais? Tudo certo. Para efeitos de submissão, basta o nome do ficheiro ser igual ao título do conto. No teu computador pessoal, pode continuar a chamar-se titulo-do-conto-concurso-mes-ano.doc que está tudo bem.
O que não fazer:
Usar um tipo de letra diferente do que é pedido no regulamento (quase sempre pedem Times New Roman), nem vários tipos de letra no mesmo texto — precisas de destacar alguma parte? Usa itálicos.
Escrever a cores. Sei que a maioria dos regulamentos (talvez todos) não especifica que o texto deve estar a preto, mas o texto deve estar a preto. É motivo de desqualificação? Provavelmente, não, mas distrai e cansa a vista. Novamente: precisas de destacar alguma parte? Usa itálicos.
Formatar o conto como se fosse um trabalho para a escola. Não tem impacto na avaliação, mas já vou entrar na história distraída com os acessórios. Exemplos de alguns acrescentos desnecessários: inserir cabeçalhos ou rodapés, títulos com efeitos sombreados, texto dentro de uma moldura. Pôr números nas páginas pode ser útil se quem está a ler o conto prefere fazê-lo em formato físico (não é o meu caso).
Separar o conto em capítulos numerados e/ou com título. Os contos não têm capítulos. Precisas de separar «episódios» ou secções? Separa-os com * ou #.
Não separar «episódios» de forma clara. Na maioria das vezes, dois espaços entre cada «episódio» em vez de um não são suficientes para resolver ambiguidades. E quem está a ler o teu texto precisa mesmo de ter o trabalho facilitado para uma avaliação justa.
Começar discurso direto com hífen (-) em vez de travessão (—). Por experiência própria, sei que este «erro» acontece por desconhecimento técnico. Nem todos os processadores de texto corrigem automaticamente dois hífens seguidos sem espaço para travessão. Na checklist abaixo, partilho os atalhos para este e outros lapsos mais comuns.
Enviar um texto com «assinatura estilística» que prejudique a compreensão. É raro, mas acontece. As tuas idiossincrasias como autor resolvem-se e justificam-se mais tarde na edição, não na fase de submissão. Lembra-te de que, se a submissão é anónima, eu não sei quem escreveu o conto e há certas particularidades que nem sempre são claras para quem está a ler — não vou conseguir distinguir entre erro e escolha do autor (e isto também é discutível).
Ultrapassar o número máximo de palavras. Acontece com demasiada frequência e é quase sempre fonte de uma enorme frustração. Tolero até 20 palavras acima do limite; entre 20 e 200, deixo à consideração de quem organiza o concurso; um texto com acima de 200 palavras a mais é sinal de preguiça ou pressa (ambas inimigas dos escritores). Há concursos onde o grau de tolerância é zero, sobretudo aqueles que recebem centenas de submissões.